Grandes Entrevistas de Engenharia com… Nuno Nunes

Fomos conversar com Nuno Nunes, o engenheiro de Sistemas e Redes, da Lactogal, que partilha connosco o seu percurso, a forma como vê Ordem dos Engenheiros, a sua percepção da Engenharia Informática e o porquê de continuar a ser uma profissão de homens. Mas Nuno vai mais longe e aponta que órgãos como o Estado não podem “estar permanentemente a justificar os problemas e falhas nos seus serviços como uma falha ou erro informático, sem nunca imputar ninguém.”
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O percurso do Nuno, não começa com o tradicional ingresso no ensino superior quando termina o ensino secundário. Conte-nos um pouco como tudo aconteceu.
O meu percurso profissional começou cedo, aos 18 anos, isto porque contra a vontade dos meus pais, decidi não ingressar logo no ensino superior e resolvi fazer uma especialização na Siemens, em Perafita. Enquanto aguardava por essa especialização surgiu o convite para trabalhar na Famo e, embora fosse de forma temporária porque estava a aguardar pela especialização, a Famo fez-me o convite para ficar e aceitei permanecendo por lá durante treze anos e meio, e muito do que sou hoje como pessoa e profissional devo-o à Famo e a todos os colegas com quem trabalhei. Nessa altura resolvi tirar o CAP (Certificado de Aptidão Profissional) e comecei a dar formação profissional na área de informática em horário pós-laboral.
Essa experiência foi importante para a sua carreira enquanto engenheiro Informático?
Foi uma experiência enriquecedora porque ajudou-me a crescer e a amadurecer muito como pessoa e como profissional a todos os níveis, dado que tive de controlar turmas com formandos de diferentes idades e de diferentes contextos sociais, tive que produzir os meus próprios manuais para cada curso, etc. Entretanto licenciei-me em horário pós-laboral e em julho de 2016 integrei os quadros da Lactogal no Departamento de Sistemas de Informação na equipa de Infraestruturas e Redes, onde permaneço até ao momento.
O que faz exatamente um Engenheiro informático numa empresa como a Lactogal?
O trabalho depende muito da forma como o departamento de sistemas de informação está organizado. Na Lactogal o nosso departamento atualmente é composto por 22 pessoas e está dividido em duas grandes áreas, a área aplicacional e a área de Tecnologias de Informação, Esta última está subdividida na área de sistemas e de infraestruras e redes que é onde estou inserido. Na área aplicacional as funções são mais ao nível da gestão de processos aplicacionais e programação, e na área de tecnologias de informação as funções são mais ao nível da administração de infraestruras, sistemas e redes. Na minha equipa somos responsáveis pela gestão de cerca de 60 serviços que disponibilizamos a todo o Grupo Lactogal e de cerca de 4200 equipamentos ativos, e este trabalho de gestão engloba: instalação, configuração, manutenção, monitorização, etc,. Sendo a Lactogal uma empresa que tem as suas fábricas a funcionar 24 horas sobre 365 dias por ano, obriga-nos a ter um nível de exigência muito grande e os nossos KPI’s sempre a rondar os 100%. Dada a criticidade para o negócio de muitos dos nossos serviços, atualmente, ao nível de infraestruturas e redes, a média dos nossos KPI’s para todos os nossos sites é de 99,996%, o que é excelente e nos deixa a todos orgulhosos. Para isto muito se deve a nossa atitude pró-ativa e não reativa relativamente a todos os serviços, o que evita problemas como o que aconteceu em 2017 com o vírus WannaCry, que afetou grandes empresas por todo o mundo, e nós não tivemos um único incidente. Além destas ações temos de supervisionar a atividade das equipas dos fornecedores de serviços em temas inerentes aos pontos supramencionados, nomeadamente, no que diz respeito à implementação de novos projetos e intervenções subcontratadas.

A Engenharia informática continua a garantir emprego em Portugal?
Sim, continua, e penso que nunca tivemos um período tão bom na Engenharia Informática em Portugal e, especificamente, aqui no Norte. Projetos como a EuroNext, Natixis, entre outros, trouxeram uma nova vitalidade e uma oferta de emprego na nossa área como nunca houve. Pelo que tenho oportunidade de ir lendo, atualmente, a procura é muito superior à oferta e penso que esta situação se manterá por muitos anos até porque somos sociedades cada vez mais tecnológicas.
Quais os skills que um engenheiro deve ter para trabalhar numa empresa como a Lactogal?
Além das hard skills que são essenciais para o desempenho da nossa profissão numa empresa como a Lactogal, penso que as soft skills são cada vez mais importantes num engenheiro e em todas as outras profissões. Pôr em prática uma competência técnica é muito mais fácil que pôr em prática uma competência comportamental e, sendo nós seres humanos, devemos tentar gerir a nossa inteligência emocional de forma eficaz. Porém, mostrarmos sempre uma atitude positiva perante todas as adversidades nem sempre é tarefa fácil, mas quem o conseguir fazer, principalmente em cenários de grande pressão (que existem muitas vezes) marca a diferença. A postura e a forma como nos relacionamos e interagimos com pessoas que trabalham ao nosso lado, no chão de fábrica, ou em cargos de decisão e administração, é essencial para conseguirmos, inclusive, respostas mais sensatas e até mais paciência por parte dessas mesmas pessoas quando surge algum problema. Observo isso no meu dia a dia.
Que conselhos daria aos engenheiros que têm como objetivo trabalhar numa empresa semelhante? Como concorrer, como apresentar o CV, o que fazer?
As competências técnicas são muito importantes, mas não fundamentais, interessa ter boas bases para de uma forma ou de outra pôr em prática essas competências. Hoje em dia ninguém sabe tudo e na informática muito menos, porque o que hoje é verdade e a melhor solução, amanhã já não o é. Julgo que, cada vez mais, as empresas valorizam as soft skills, valorizam uma atitude positiva, o sentido de responsabilidade e humildade, a capacidade de sair da zona de conforto – sair do escritório e ir para o chão de fábrica sem ter medo de se sujar, permite-nos ter sensibilidade para muitas situações que de outra forma não teríamos. Quem quiser integrar o mercado de trabalho penso que é essencial ter um bom perfil no linkedIn até porque cada vezes mais as empresas de recrutamento especializado na área das TI’s procuram profissionais apenas por essa via.
A Engenharia Informática continua a ser uma profissão de homens? Porquê?
Infelizmente acho que sim embora tenha a sensação de que esse cenário esteja a mudar e já haja exceções, na Lactogal, por exemplo, no nosso departamento há 8 mulheres embora não sejam todas engenheiras, mas num total de vinte e dois colaboradores, oito mulheres, penso que já é um número razoável tratando-se da área de informática. Penso que os motivos estão muito relacionados com a socialização primária, ainda impregnada dos estereótipos de género, da mesma forma que somos orientados para brincadeiras de rapazes e de raparigas penso que o mesmo se passa em relação às profissões. É muito raro ouvirmos os pais dizerem a uma menina de 5/6 ou 7 anos que gostavam que ela fosse engenheira informática, isso mais tarde reflete-se nas escolhas que são feitas para a carreira profissional.
Qual é segredo para ser um bom engenheiro? Há segredo?
Eu penso que não há segredo para ser um bom engenheiro, antes de pensarmos em ser bons engenheiros temos de pensar em sermos boas pessoas, quem não for uma boa pessoa não pode ser um bom engenheiro ou outro profissional qualquer; gostarmos do que fazemos também é muito importante, quando fazemos algo com gosto os resultados são sempre substancialmente melhores. Além destes fatores, termos uma boa capacidade de análise crítica, concentração, raciocínio lógico, planeamento, organização, entre outros, penso que são qualidades que um bom engenheiro tem que ter. E, claro, estar disposto a fazer uma aprendizagem contínua.
A Engenharia está na moda? Porquê?
Definitivamente acho que sim, depois de muitos anos as médias de Engenharia bateram as de medicina pela primeira vez em 2017, estamos também a assistir, pela primeira vez, a alunos com média de vinte a quererem entrar em Engenharia e não em medicina. Ora, isto é um sinal de que a Engenharia está na moda junto dos mais novos! O prestígio que os engenheiros portugueses gozam no estrangeiro é importante, assim como os investimentos que grandes tecnológicas mundiais têm feito ou pensam fazer em Portugal. Penso que todos estes fatores, entre outros, têm contribuído para este “estado de graça” que a Engenharia vive atualmente em Portugal.
Por que razão é importante para um Engenheiro Informático estar inscrito na Ordem dos Engenheiros?
São várias as razões que justificam a inscrição de um engenheiro Informático na Ordem dos Engenheiros: o facto de sermos uma sociedade cada vez mais tecnológica implica que instituições de grande representatividade e importância como o Estado, por exemplo, não possam estar permanentemente a justificar os problemas/falhas nos seus serviços como uma falha ou erro informático, sem nunca imputar ninguém. Há cada vez mais serviços que só se fazem online e ainda não há legislação que garanta aos cidadãos que esses serviços sejam feitos por engenheiros qualificados e, para tal, temos de caminhar no sentido de dar essas garantias aos cidadãos tal como já acontece com as obras de Engenharia Civil, por exemplo. Ora, para isso precisamos da Ordem para fazer a defesa dos interesses, dos direitos e a proteção/monitorização do exercício da nossa profissão. Precisamos da Ordem para que nos valorizem e nos deem dignidade e prestígio. Precisamos da Ordem para termos acesso a ações de formação técnica e a algumas iniciativas com condições muito vantajosas que, de outro modo, não teríamos. Precisamos da Ordem para apoio jurídico se necessário, e pela oportunidade de conhecer e partilhar experiências com outros engenheiros.
Qual acha ser ou qual deveria ser o papel da Ordem dos Engenheiros na vida profissional dos Engenheiros?
O papel da Ordem dos Engenheiros na nossa vida profissional além das questões inerentes à profissão junto dos órgãos de soberania e da sociedade, deve ser um papel cada vez mais de proximidade junto dos engenheiros, e penso que isto tem sido conseguido pela atual direção da OERN, aliás, isto nota-se pelas inúmeras atividades que são feitas durante o ano desde formações, visitas técnicas, etc., e pelos números de associados que têm entrado para a Ordem. Julgo que para isto muito tem contribuído a comunicação que é feita através das redes sociais e outros canais de comunicação digitais, que hoje em dia são, sem dúvida, a forma mais eficiente de chegar aos membros e não só.
Nomeie um engenheiro do Norte que esteja a desenvolver um trabalho que aprecia, dentro ou fora de Portugal.
O Eng. João Barros, Founder & CEO da Veniam, tive oportunidade de o ouvir no evento “Engenho 2017” da OERN em Setembro do ano passado, e a partir daí comecei a acompanhar mais de perto o seu projeto, é sem dúvida um projeto ambicioso e que nos devia deixar a nós engenheiros portugueses orgulhosos pelo que somos capazes de criar, é uma bela história a que deu início à Veniam e uma inspiração para todos os engenheiros.
Há engenharia em tudo o que há? Explique.
Sem dúvida que há! Tudo o que nos rodeia no dia a dia tem Engenharia aplicada, desde uma simples folha de papel, a um iogurte, uma bicicleta, um telemóvel, etc., e é graças à Engenharia que hoje temos o mundo muito melhor que há 20 anos e que nos permite estar todos os dias a inovar e desenvolver coisas novas em todas as áreas para tornar a vida de todos melhor e mais facilitada.

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