Grandes Entrevistas de Engenharia com… Pedro e Diogo Costa

Os estudantes de Engenharia e velejadores Pedro e Diogo Costa estão a caminho dos Jogos Olímpicos Tóquio 2020 para lutar por uma medalha para Portugal, na modalidade de Vela 470. Mas antes partilharam as suas ambições, esperanças e até fizeram um apelo a todos os engenheiros.

Entrevista: Catarina Soutinho | Design: Melissa Costa | Transcrição: Sofia Vieira | Fotos: direitos reservados



Ambos estudantes de Engenharia da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), Pedro e Diogo Costa relevam nesta entrevista a sua perceção sobre a importância da Engenharia no desporto que adotaram como vida. A caminho dos Jogos Olímpicos que se realizam em Tóquio entre julho e agosto deste ano, Pedro e Diogo assumem que o segundo lugar no Campeonato do Mundo “pode ser um indício bom para os Jogos Olímpicos.” Para já contam, naturalmente, com o apoio de todos os engenheiros: “levamos os 60 mil engenheiros da Ordem, e também 11 milhões de portugueses, todos connosco no barco e na bandeira que vai na vela”. Mas para o futuro precisam também de novos apoios e até engenheiros que ajudem na melhor performance da embarcação. O convite ficou feito nesta entrevista.
Conheça melhor Pedro e Diogo Costa à conquista de Tóquio.
 
Para a maioria das pessoas o Pedro e o Diogo surgiram agora na sequência do apuramento para os Jogos Olímpicos. Mas o vosso percurso não começou agora…
Pedro Costa  Nós começámos em pequenos, com 6 anos, numa escola de vela normal. Não era competitivo, e foi onde aprendemos as bases da navegação. Depois juntamo-nos como equipa no fim de 2012 e aí eramos bastante amadores ainda (risos). Depois, no ano de 2014-2015, foi quando começámos a participar em provas internacionais. Esse foi o ano em que eu entrei na faculdade (FEUP). O Diogo entrou no ano seguinte, e foi justamente quando ele começou a faculdade, que ganhámos um Campeonato do Mundo nessa classe – que já não era totalmente amadora. Depois começámos a campanha olímpica, em 2017, que devia ter durado quatro anos, mas acabou por durar cinco (devido à pandemia).
Diogo Costa O primeiro ano da faculdade foi ótimo. Entrei em Engenharia Civil, mas o que eu queria mesmo era Engenharia Informática. Então troquei no final do primeiro ano. Quando fui para o segundo ano, coincidiu com a altura que isto ficou mais “cheio”, e decidi congelar a matrícula. Mas claro, espero voltar porque a Engenharia Informática é algo que me apaixona. Mais do que isso, será muito útil para a vida que nós vamos levar a seguir, mesmo que esteja unicamente ligado à vela. Eu digo sempre que é importante as pessoas fazerem mais alguma coisa para além da vela. Se assim não for, acaba-se por ficar com o pensamento muito fechado. A mentalidade de engenheiro, que normalmente é muito boa, ligada a tudo o que é matemática e rigor, é ótima para o desporto que nós fazemos.
 

“A dada altura tinha imenso prazer porque fazia duas coisas que me apaixonavam: a vela de competição, e a Engenharia Civil.” (Pedro Costa)

“A mentalidade de engenheiro, que normalmente é muito boa, ligada a tudo o que é matemática e rigor, é ótima para o desporto que nós fazemos.” (Diogo Costa)

 
 

Mas conciliar os estudos em Engenharia e fazer uma qualificação olímpica, é complexo…
Pedro Costa Nos dois primeiros anos continuamos a estudar os dois, depois em 2018 – mais ao menos o meio da campanha para os Jogos Olímpicos – na primeira prova de apuramento percebemos que não era assim tão simples qualificamo-nos para os Jogos Olímpicos e que tínhamos de fazer uma escolha entre navegar e estudar, ou melhor, qualificarmo-nos para os Jogos Olímpicos ou estudar. Aí percebemos que se queríamos realmente qualificarmo-nos não íamos ter tempo para tudo e infelizmente tivemos de pôr os estudos em pausa. De qualquer forma, do meu lado, durante a quarentena aproveitei a oportunidade para voltar a estudar e consegui fazer mais duas cadeiras (risos). Não é muito porque, entretanto, tivemos de ir para fora e não consegui fazer mais exames. Mas quero dizer que da parte dos estudos eu também estou muito contente com o que tenho feito até agora, eu realmente adoro Engenharia Civil (sorriso). A dada altura tinha imenso prazer porque fazia duas coisas que me apaixonavam que era a vela de competição, e a Engenharia Civil. Lembro-me que saltava da pele de engenheiro para a pele de desportista, às vezes uma semana era um, na outra semana era outro. Mas não tinha nenhuma dificuldade porque gostava muito do que fazia, dava-me muito prazer e tive muita pena de ter que tomar a decisão de infelizmente pôr os estudos em pausa, mas vou voltar.
 

“Os velejadores de topo nestas classes olímpicas normalmente estudam ou já estudaram Engenharia ” (Diogo Costa)

 

Acham que a vossa formação, o Pedro Engenharia Civil e o Diogo ainda no início da Engenharia Informática, que vos dá mais skills para a vossa atividade desportiva?
Diogo Costa Sem dúvida. No desporto nós temos uma parte de estudo de comportamento, de materiais e um bocadinho de estudo dos campos de regata (são muitos números) que é preciso estudar direito, com rigor, fazer estatísticas, etc. Nós vamos para sítios e temos de saber ao certo para onde é que vamos. Então, ter esta estatística, saber o que o vento faz em cada momento, essa parte do rigor que nos vão ensinando na faculdade durante todo o percurso académico é importantíssima. Eu diria que, se calhar, faz a diferença, porque realmente os velejadores de topo nestas classes olímpicas normalmente estudam ou já estudaram cursos de Engenharia ou de Gestão. Cursos que envolvam números e dão uma mentalidade muito crítica, e ajuda-nos a perceber algumas coisas que seriam difíceis de perceber se não tivermos esta mentalidade.
Pedro Costa Quero só acrescentar que esse pensamento analítico é muito importante porque o desporto da vela que não depende só do desempenho físico. Durante a campanha olímpica temos uma equipa bastante grande, desde a equipa de comunicação até aos treinadores, preparadores físicos, e é preciso fazer muitas escolhas. Considerar o material, afinar os barcos porque eles têm diferentes materiais e é bastante dinâmico percebê-los. Qual o ponto da flexão do mastro, se empurrar naquele sítio para a frente ou para trás o que é que vai acontecer, porque é que se puxar aqui o mastro fica mais curvo ou mais direito, tudo isto são temas que são iguais aos que estudámos em Engenharia. De resto, o pensamento analítico, o processo de ter um problema, reunir informação, pôr várias hipóteses, considerar os prós e contras e tomar uma decisão penso que é muito parecido com algumas tarefas de Engenharia.

“Vê-se cada vez mais equipas a contratarem engenheiros

para estudarem o comportamento dos mastros, do patilhão, do barco.” (Diogo Costa)”

 
É preciso ter um pensamento à engenheiro para um desporto como a vela?
Pedro Costa – Sim, acho que sim (risos). Na vela não é tudo uma corrida, não é preciso correr 100 metros. É preciso considerar várias coisas, o vento é uma delas, porque é uma variável que não se controla. Os barcos estão na água, que é outra variável, a corrente, que também não se controla e basicamente há um conjunto de variáveis das quais é preciso tentar tirar o melhor proveito. Acho que será muito parecido com o que seria, por exemplo, um projeto de Engenharia, várias variáveis, vários recursos, quais usar, em que altura, constituir uma equipa, analisar profissionais e escolher as posições para a equipa, acho que tem tudo a ver com o que aprendemos.
Diogo Costa – Sim, vê-se cada vez mais equipas a contratarem engenheiros para estudarem o comportamento dos mastros, do patilhão, do barco. Acho que se tivermos isto dentro de nós podemos cortar algum caminho e encurtar algumas relações e perguntas.
 
Quais são as vossas reais expectativas para os Jogos Olímpicos? Podemos apostar as “fichas todas” que vocês irão trazer uma medalha ou ainda é cedo para pensar nisso?
Pedro Costa (sorriso) Eu acho que como qualquer atleta não podemos obviamente comprometer-nos com nenhum resultado, isso não seria inteligente de todo. Mas ficámos em segundo no campeonato do Mundo, isso pode ser um indício bom para os Jogos Olímpicos. De qualquer maneira o nosso compromisso é de chegar à Medal Race, que é a última regata do campeonato, em que só podem participar os dez primeiros da classificação geral e conta a dobrar em relação às regatas normais. Portanto o nosso objetivo é chegar a esta Medal Race e dentro desta lutar pelo melhor lugar que conseguirmos atingir. Claro que se durante o campeonato estivermos em algum lugar melhor que o décimo não vamos deixar ninguém passar (sorriso). E pronto, a nossa promessa principal, a nossa missão quando vamos aos Jogos Olímpicos é de trabalho e dedicação, continuar com o esforço que temos feito até agora. Vamos procurar dar o nosso melhor e ver que resultado conseguimos obter com isso.

“Levamos os 60 mil engenheiros da Ordem, e também 11 milhões de portugueses, todos connosco no barco e na bandeira que vai na vela. Portanto é um prazer ter 60 mil engenheiros a bordo connosco (sorriso).” (Pedro Costa)

 
Vão representar Portugal, obviamente, mas vocês vão também representar quase 60 mil engenheiros da Ordem dos Engenheiros. Já pensaram nisso ou prometem que vão começar a pensar a partir de agora?
Pedro Costa (pausa, suspiro) Acho que é muita gente para representar. (risos) Levamos os 60 mil engenheiros da Ordem, e também 11 milhões de portugueses, todos connosco no barco e na bandeira que vai na vela. Isso é um motivo para ter alguma pressão, esperemos que não se abata sobre nós negativamente! Tentamos usá-la de forma construtiva e obviamente, nestas alturas, pensamos que, se há pressão, é porque há um reconhecimento do potencial. As pessoas, tanto os engenheiros como outras pensam, e com razão, que por ficarmos em segundo no mundial podemos ambicionar ter um bom resultado nos Jogos Olímpicos e, portanto, essa pressão para nós, em princípio, vai ser positiva. Ela só existe porque as pessoas acham que somos capazes. Portanto é um prazer ter 60 mil engenheiros a bordo connosco (sorriso).
 
Quanto tempo de facto, da vida pessoal e académica, que têm de abdicar para conseguirem chegar ao topo da vossa carreira?
Pedro Costa Funciona exatamente como um emprego normal, é engraçado. Treinamos 22 dias por mês e descansamos oito, só que não calha nos fins-de-semana (risos). Normalmente os domingos são dias de descanso, não por ser domingo, mas porque calhou assim com os nossos parceiros de treino. Depois ao final de 22 dias fazemos uma semana de descanso e depois voltamos a retomar para mais um bloco. Os campeonatos duram uma semana, nas épocas antes dos campeonatos normalmente é costume aumentar um bocadinho mais o descanso para não causar sobrecarga de treino, mas o tempo normal é de 22 dias de trabalho e oito de descanso.

Que tipos de apoio é que têm e do que é que precisam, ou seja, o que seria uma mais-valia para a vossa campanha para os Jogos Olímpicos e daqui para a frente?
Pedro Costa Falando do passado, para contextualizar, nós em 2017 entrámos na equipa olímpica e aí tivemos um grande apoio do Comitê Olímpico Português. Infelizmente não conseguimos renovar o lugar que permitia acesso a esses apoios. Então em 2018, como perdemos esses apoios ficamos “entregues” à Federação Portuguesa de Vela e às equipas da Federação que nos suportaram em alguns campeonatos. Nós considerámos que para conseguir o apuramento Olímpico, para conseguir fazer uma boa preparação e uma boa campanha olímpica, era preciso um bocadinho mais do que isso. Assim, investimos nós, particularmente, muito dinheiro para complementar a preparação que nos dava a Federação. Agora, no fim da campanha, recentemente, tivemos ajuda de patrocinadores que deram o empurrão final, o que foi ótimo.

“Estamos ativamente à procura de patrocinadores e pessoas que se queiram juntar ao nosso projeto.”

E agora?
Agora e no futuro, para podermos fazer uma preparação de excelência, queremos completar com apoios extra e, portanto, estamos ativamente à procura de patrocinadores e pessoas que se queiram juntar ao nosso projeto. Estamos à procura de novos apoios, novas pessoas que se queiram comprometer com o nosso projeto, entrar a bordo do 470 connosco e, portanto, deixamos um apelo, naturalmente. Se alguém estiver interessado, é relativamente fácil contactar-nos através do instagram (@costassailing) ou Facebook Costas Sailing, ou até perguntar a instituições por contactos nossos e aceitaremos qualquer proposta obviamente, não estamos aqui para dizer que não. (risos)

Quais são os vossos patrocinadores atuais?
Pedro Costa A PSL é uma empresa de transportes marítimos entre Portugal e Angola, que oferece um serviço de cargas, onde as cargas nunca saem do navio, desde o destino inicial até ao destino final. É uma boa “Engenharia” e acho que uma mais-valia perante o panorama em África. Temos também a Sysnovare que é uma empresa cheia de engenheiros de software, principalmente na gestão de recurso humanos, software de gestão de contraordenações.
A BBDouro que é uma empresa de formação de vela, ou seja, atividades de team building em barcos à vela, e também a aulas e cursos de vela. E a Porto Comunicação que é uma empresa que trata da nossa comunicação como atletas, que nos ajuda na parte da impressa e das redes sociais, e que tenho de dizer que têm feito um excelente trabalho.
 

“Gostava de deixar um apelo aos engenheiros que se interessem por desportos, nomeadamente por vela ou por desportos náuticos, que se juntem a nós porque há muitíssimo trabalho de desenvolvimento a fazer com barco à vela.”

Há, portanto, margem para receberem mais apoios…
Pedro Costa Sim, e queria também deixar uma mensagem final aos Engenheiros. Há muitos velejadores que trabalham com engenheiros. Nós, se continuarmos para Paris, vamos já ter mais alguma experiência e mais tempo, e por isso gostava de deixar um apelo aos engenheiros que se interessem por desportos, nomeadamente por vela ou por desportos náuticos, que se juntem a nós, porque há muitíssimo trabalho de desenvolvimento a fazer com barco à vela. No desporto, o acréscimo de performance que pode haver com materiais bem estudados, ou com a dinâmica do barco bem estudada, bem esquematizada e bem controlada, pode ser enorme e adorávamos que a nossa equipa crescesse e que esse crescimento fosse por ter um engenheiro connosco, que nos pudesse ajudar com estas questões e que quisesse participar neste projeto, portanto deixo o convite a quem se quiser juntar a nós.
 
Há Engenharia em tudo o que há?
Diogo Costa Sim, claro, porque tudo depende da Engenharia hoje em dia. Desde a cama onde dormimos, ao telefone que nos acorda.
Pedro Costa Eu concordo com o Diogo. Obviamente que na vela tudo o que fazemos é relacionado com elementos físicos que são dinâmicos, acho que num barco há muitíssima Engenharia.
 
Contactos: info@costassailing.pt | siteFacebook  | Instagram
 
 

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