“O Engenheiro é confrontado diariamente com desafios e adversidades”


Nome: António  Solheiro
Idade: 30
Empresa: Mota-Engil Engenharia e Construção
Função: Engenheiro técnico-comercial
Obra ou obras que está a desenvolver no momento : Metro do Porto – Linha Circular – Planeamento e orçamentação da empreitada
 
As atuais restrições devido à Covid-19 tiveram impacto na sua atividade profissional? A que nível?
Naturalmente tiveram impacto. De momento encontro-me, exclusivamente, em regime de teletrabalho. Mantenho, no entanto, a totalidade das minhas funções e o trabalho produzido, o qual já era via computador, mantem-se inalterado. Assim, considero que as atuais restrições alteraram, principalmente, a forma como interajo com os meus colegas, a qual é, agora, sobretudo, materializada através de plataformas de teletrabalho, como o ZOOM ou o Microsoft TEAMS. Embora o contacto presencial tenha um valor insubstituível, a verdade é que é comum termos de trabalhar conjuntamente com equipas localizadas em Lisboa ou, até, no estrangeiro. Neste momento, contudo, houve um acelerar, por necessidade, da parte de todos, na adoção de novas ferramentas de teletrabalho, as quais, a meu ver, até aumentaram muito a produtividade para estas equipas que, habitualmente, já trabalhavam à distância.
Relativamente ao trabalho com os colegas com quem partilho, habitualmente, escritório, creio que temos conseguido responder bem aos desafios que nos têm surgido e que o teletrabalho, apesar de requerer alguma habituação, não tem constituído um impedimento. Continuamos a ter metas perfeitamente definidas nos prazos que obrigatoriamente temos que cumprir. Este facto é característica da Área Comercial, quer o trabalho seja desenvolvido no escritório ou em casa, quer seja presencialmente, quer à distância.  Da parte dos clientes notaram-se, numa fase inicial, alguns adiamentos ou alargamentos nos prazos de entrega de propostas, o que se justifica pela incerteza de toda esta situação. Mas, a verdade é que, continua a haver muito trabalho e, apesar das prorrogações mencionadas, não se têm visto cancelamentos de empreitadas em agenda, o que é muito importante, pois mostra que está a ser feito um esforço transversal de não recuo nos investimentos programados. No entanto, sente-se sim, alguma insegurança generalizada relativamente ao evoluir da situação e ao que isso implicará no futuro não só para estes investimentos, mas também para aqueles que, em situação normal, surgiriam.
Que medidas tomou para se manter no ativo e o seu posto de trabalho?
Em termos de medidas, tratou-se sobretudo de seguir aquelas que a empresa previu para os colaboradores e que foram afinadas para cada departamento e função, juntamente com alguma adaptação, da minha parte, a novas formas de trabalhar. A empresa na qual trabalho, foi muito rápida a agir. Mesmo antes de declarado o estado de emergência, criou condições e forneceu ferramentas para garantir a operacionalidade do teletrabalho aos colaboradores cuja função o permita (que é o meu caso), assegurando a continuidade da atividade da empresa e protegendo os postos de trabalho. Da minha parte tratei, inicialmente, de me familiarizar o mais depressa possível com as novas ferramentas e, de momento, procuro manter-me em contacto síncrono com os colegas com quem trabalho mais diretamente. Ao nível das equipas de trabalho em que me insiro temos tido um cuidado acrescido em realizar reuniões periódicas (por videoconferência) e adotar deadlines intermédias para assegurar o alinhamento do trabalho desenvolvido por todos e o cumprimento dos prazos pré-definidos.
Terminada esta fase, como irá adaptar-se para retomar o seu trabalho em pleno?
De momento, encontro-me a trabalhar em pleno, embora em regime de teletrabalho. Acredito que muitas mudanças que estamos agora a implementar vieram para ficar e que, doravante, ultrapassada esta fase, será mais frequente haver um misto entre trabalho presencial e teletrabalho, dentro das equipas e de projeto para projeto. No que me toca, certamente que continuarei a recorrer aos métodos e ferramentas que adotei neste período e que se mostraram mais produtivos.
Na sua opinião, que efeitos terá este período na atividade do Engenheiro Civil?
Relativamente à atividade do Engenheiro Civil, na minha opinião, esta será afetada na consequência dos impactos que sofrer o setor. Por um lado, está a ser posta à prova a capacidade das empresas para absorverem todo o esforço que lhes está a ser exigido nesta fase e, por outro, ainda não há certezas relativamente aos níveis de investimento posteriores ao surto. Creio que a variável principal aqui é o tempo: o impacto nas empresas e as dificuldades na recuperação serão tanto maiores quanto mais prolongado for o período de condicionamento. A construção civil é um setor de atividade que, em toda a sua vertente de obra, não é compatível com teletrabalho. Assim, atualmente, tem-se visto que as empresas do setor se esforçam para manter a execução das empreitadas, enquanto adotam medidas de distanciamento social em todos os trabalhos que o permitem. Mas, mesmo quando não parada, a execução das empreitadas está, de uma forma geral, a decorrer a um ritmo bastante mais baixo, e os constrangimentos são de diversa ordem: a mão-de-obra é limitada, há muitos subempreiteiros com atividade reduzida ou parada, as fiscalizações também apresentam capacidade de trabalho diminuída e as cadeias de abastecimento de materiais, sobretudo os provenientes do estrangeiro, estão fortemente comprometidas.
Tudo isto tem complicado muito a execução das empreitadas, quando não as obriga a parar. E trabalhar a um ritmo mais lento, implica faturar menos por unidade de tempo. O problema é que, como é sabido, todas as empreitadas têm custos fixos, nomeadamente, custos de estaleiro – como salários dos trabalhadores e alugueres de equipamento – e, ao faturar menos durante um determinado período, poderá ocorrer que uma empreitada que até então estava a correr de feição, em boa execução e lucrativa, poderá tornar-se um prejuízo para o empreiteiro. Portanto, dependendo do tempo que estes condicionamentos durarem, a própria saúde financeira das empresas pode ficar ameaçada. Considero que ocorrerá sempre algum ressentimento das empresas e, a manterem-se as tendências de abrandamento no investimento que se têm verificado, julgo inevitável que todas as áreas da engenharia civil sejam afetadas, desde a construção ao projeto.
Que recomendações, sugestões ou tipo de ações entende que poderão minimizar o impacto negativo na Engenharia Civil?
Relativamente às empresas que atuam no setor, na minha opinião, será muito importante que se procure que o abrandamento na execução das empreitadas seja o menor possível, durante este período. É o que as empresas já têm feito e é o que, a meu ver, se pode continuar a fazer. É muito importante que este esforço seja transversal a todas as empresas envolvidas no setor, desde o fornecimento dos materiais à execução dos trabalhos ou à fiscalização. Medidas como a compra de materiais com antecedência, por exemplo, poderão ser muito úteis para proteger de eventuais interrupções no fornecimento e a adoção de equipamento de proteção individual para execução de trabalhos que exigem maior proximidade de meios humanos, penso que é indispensável. O estado terá também, certamente, um papel fundamental. Apesar da resiliência que as empresas têm mostrado, creio que serão necessárias medidas para compensar, ainda que parcialmente, o esforço financeiro que estão a suportar neste período. Por outro lado, e não menos importante, creio que é essencial que se mantenham, na medida do possível, os grandes investimentos públicos que estavam previstos para os próximos anos.
Segundo o Boletim Mensal de Estatística do INE, de março de 2020, o Valor Acrescentado Bruto (VAB) do setor da construção, em 2019, correspondeu a 4,4% do total nacional e relativamente ao emprego, segundo dados da pordata, representou, no mesmo ano, 6,2% da população empregada em Portugal. Estes números mostram o quão importante é o nosso setor de atividade para a economia nacional e, portanto, estou certo de que todo o investimento que seja feito na sua recuperação beneficiará o país por inteiro. Se fizermos uma gestão adequada da crise e investirmos numa retoma sustentada, poderemos conseguir que o setor da construção seja uma forte alavanca para a recuperação económica do país.
Que outra mensagem gostaria de deixar a quem irá ler esta entrevista
Gostaria de deixar uma palavra de força, coragem e fraternidade para todos os que diariamente enfrentam esta pandemia – aqueles que estão em confinamento, aqueles que continuam a trabalhar e aqueles que se dedicam a cuidar dos seus entes queridos. Estamos todos juntos no mesmo barco. Somos a geração a quem tocou este desafio e estou certo de que a aprendizagem que hoje fazemos será muito útil para lidarmos com pandemias futuras. Acredito que após a Covid-19 teremos um mundo mais unido, mais solidário e mais consciente do bem comum.  Juntos vamos vencer e ficar mais fortes!
 

PERFIL
Nome: Madalena Peixoto
Idade: 40 anos
Empresa onde trabalha: Fase – Estudos e Projectos, S.A.
Obra ou obras que está a desenvolver momento: Aproveitamento Hidroeléctrico de Alto Tâmega – Vila Pouca de Aguiar
 
As atuais restrições devido à Covid-19 tiveram impacto na sua atividade profissional? A que nível?
As atuais restrições devido à Covid-19 tiveram impacto na minha atividade profissional, na medida em que fizeram com que fossem tomadas várias medidas relacionadas com planos de contingência desenvolvidos não só pela empresa que represento mas também pelo Dono de Obra para o qual trabalho, alterando a anterior dinâmica normal de trabalho. Ambos os planos foram confluentes nas medidas tomadas no que respeita às recomendações da DGS, mas as definidas pelo Dono de Obra foram ainda mais adaptadas à realidade diária em que trabalho. Nesse sentido, para cobrir as necessidades diárias de controlo da construção durante todo o horário de laboração da empreitada, o Dono de Obra incentivou a criação de duas equipas com pessoas com as mesmas valências, competências e responsabilidades em horários distintos e sequenciais, que nunca se cruzam e com meios próprios para que não haja contacto pessoal entre os elementos constituintes de cada equipa. Isso levou a que tivesse redução de horário presencial no local de trabalho em cerca de 2h/dia e que a restante parte do meu horário de trabalho seja de prevenção em casa para apoio em qualquer assunto que seja necessário. Por outro lado, as reuniões presenciais deixaram de existir, passando a ser realizadas, quer por chamada telefónica quer por videoconferência. Todas estas alterações levaram a que a dinâmica diária de trabalho seja um pouco diferente do habitual, mas tem tido resultados não muito diferentes daqueles que se tinham anteriormente.
 
Que medidas tomou para se manter no ativo e o seu posto de trabalho?
As medidas que adoptei na minha actividade profissional para me manter activa foram:

– seguir as medidas recomendadas pela DGS e contemplados em planos de contingência da minha empresa e do Dono de Obra: medidas de protecção individual, comportamentos de distanciamento social, desinfecção do posto de trabalho, veículos de transporte e de outras superfícies de contacto, desinfecção e higienização de mãos, ventilação de espaços fechados, medição de temperatura corporal diariamente à chegada e à saída do local de trabalho, evitar ao máximo a utilização de espaços comuns como por exemplo refeitório, bem como a partilha de objectos e alimentos entre colegas e observação de possíveis sintomas suspeitos meus e de quem me rodeia;

– utilizar sempre que necessário máscaras, luvas e gel desinfectante que foram disponibilizados nos locais de trabalho

– conhecer em detalhe os procedimentos a adoptar na situação de detecção de sintomas suspeitos

– sensibilizar quem me rodeia para que não diminua a adopção de comportamentos que minimizam a transmissão do vírus

– melhorar metodologias de trabalho e recorrer a todos os meios ao meu alcance para tornar o mais eficaz possível a troca de informação, a resolução de problemas e as reuniões não presenciais

 
Terminada esta fase, como irá adaptar-se para retomar o seu trabalho em pleno?
Apesar de acreditar que esta fase será ainda prolongada no tempo e que teremos todos que adoptar as medidas necessárias para nos protegermos a nós e aos outros até que se desenvolvam mecanismos de prevenção e tratamento deste vírus, creio que o reajuste ao trabalho em pleno será sem muitas dificuldades, de forma bastante natural e de acordo com a normalidade que se viva em cada momento. O Engenheiro é confrontado diariamente com desafios e adversidades que põem constantemente à prova a sua resiliência, a sua capacidade de resolução de problemas e a sua adaptabilidade. Este é só mais um momento de provação e superação. De qualquer forma, resultará que do período que em estejamos condicionados, alguns comportamentos tomados e métodos de trabalho adoptados mais eficazes prevalecerão no futuro.
 
Na sua opinião, que efeitos terá este período na atividade do Engenheiro Civil?
Bom, sendo que se tem vindo a verificar ao longo dos tempos que o estado da economia se reflete directamente na actividade da construção civil, creio que iremos regredir ao nível por que passamos na anterior crise económica portuguesa: menos construção, menor oferta de trabalho, maior dificuldade e até impossibilidade em exercer a actividade para muitos de nós. Por outro lado, como será uma crise mundial, poderá não ser tão fácil como no passado ter a hipótese de recorrer a desafios fora de Portugal.
 
Que recomendações, sugestões ou tipo de ações entende que poderão minimizar o impacto negativo na Engenharia Civil?
Acima de tudo, dentro daquilo que são projectos e empreendimentos em curso, não incentivo à sua paragem, mas sim manter a actividade, adoptando todas as medidas de protecção necessárias. Evidentemente, nos tempos que correm e tendo em consideração as ferramentas e os meios informáticos e de comunicação que existem, desde que os colaboradores tenham condições para o fazer, é uma boa opção recorrer ao teletrabalho sempre que o tipo de trabalho que se está a desenvolver o permita.
 
Que outra mensagem gostaria de deixar a quem irá ler esta entrevista
Protejam-se e protejam os outros. Temos de aprender a viver com esta realidade durante mais uns meses. É um momento de muitas dúvidas e incertezas para muitos de nós, concerteza. Mas este desafio vai ser superado, à semelhança do que já aconteceu na crise anterior. E este momento pode ser encarado como um momento para redefinição de métodos de trabalho e de reinvenção da nossa capacidade de resposta a desafios previsíveis e desconhecidos que aí vêm. Força a todos!

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