A segunda Conferência do “Há Engenharia fora da caixa” teve como convidado o prestigiado médico Carlos Vasconcelos, que nos traçou de uma forma muito clara o perfil da Covid-19 e qual o seu comportamento. Falou da desinformação, do uso ou não uso de máscaras, das vacinas e muitos outros detalhes. O médico respondeu a todas perguntas dos muitos engenheiros que, online, participaram ativamente nesta conferência. Carlos Vasconcelos alertou ainda que “a Engenharia hospitalar é crucial” no combate a esta e outras doenças.
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A segunda conferência arrancou com Joaquim Poças Martins, Presidente da OERN a dar as boas-vindas ao convidado e participante lembrando que “nós, os engenheiros, gostámos de fazer coisas, mas convém sabermos que vamos fazer as coisas certas. Neste momento é muito difícil saber o quê. Já não é mau sabermos fazer as perguntas certas, e por isso convidamos um conjunto de ilustres personalidades, não engenheiras, de caraterísticas e formações muito diferentes, para pensar o futuro connosco.”
A condução desta conferência ficou porém a cargo de Pilar Baylina, vice-presidente da OERN que na sua introdução afirmou: “Neste momento há um desconhecimento muito grande à volta disto e como diz o Joaquim Poças Martins, quando nós sabemos as respostas, mudam as perguntas.” Pilar, lembrou ainda que que “o século XX e o século XXI têm sido um manancial de avanços da ciência. Nos últimos 50 anos, temos tido ganhos galopantes (…) por isso é que falamos da importância da Engenharia e da Medicina, a importância da Física na Medicina, quer dizer, se isto for feito de uma forma integrada, faz com estes avanços sejam verdadeiramente galopantes.”
O que Carlos Vasconcelos disse…
A Covid-19 não será certamente a última nem a pior das pandemias que temos e que iremos continuar a ter.
Sobre o papel do Engenheiros e da Engenharia
A Engenharia, de facto, é um campo imenso. Eu creio que cabe aos próprios Engenheiros saber até onde podem ir e desafiarem-se a si próprios, porque podem ir muito longe e serem muito úteis na sociedade, para além do que já são, claramente.
Pilar Baylina: Nós (engenheiros) estamos aqui para ajudar, nós temos um papel muito importante. Qual é a qualidade de ar dos hospitais? Qual é a qualidade de ar das urgências , onde entra tanta gente e tem de entrar porque é urgência. É um desafio para Engenheira. Que outros desafios se colocam aqui, para além da genética, nós temos aqui um leque, infindável de oportunidades?
O arejamento é essencial, e por isso, o papel da Engenharia hospitalar é crucial. Não é demais salientar a importância da Engenharia hospitalar porque é muito importante saber, numa enfermaria, de onde vem o ar, para onde vai e quantas vezes é renovado esse ar. Por isso sem dúvida que tem muitas oportunidades. Deixe-me dizer que, a urgência do meu hospital, por exemplo, tem renovação do ar, x renovações por hora, o ar passa por filtros EPA, filtros de alta eficiência, para, precisamente, bloquear micróbios. Portanto, isso é fundamental saber e não é só desenhar isso e construir com isso, é, obviamente, manter e a reavaliar a situação para saber se está a ser adequada. Mas a Engenharia, de facto, é um campo imenso, a Engenharia dita Biomédica, eu li, também, qualquer coisa, de um cimento em que colocam as bactérias, em crescimento, depois cresce, um tijolo partido, tijolo com esse cimento acaba por se completar… (risos) Não sei se é ficção. Sabemos que as próteses podem ter antimicrobianos para defender das infeções, sabemos que os têxteis podem, de facto, também, ter antimicrobianos e podem, também, ter outras qualidades, como, defender os doentes com fotossensibilidade dos ultravioletas. Portanto, eu creio que cabe aos próprios Engenheiros saber até onde podem ir e desafiarem-se a si próprios, porque podem ir muito longe e serem muito úteis na sociedade, para além do que já são, claramente.
Sobre a vacina e o plano B
Todos nós estamos dependentes do que vai acontecer, eu não quero ser nem otimista nem pessimista demais. A minha experiência é com HIV e como sabem fala-se de vacinas para esta doença há anos e ainda não conseguimos, pois, este vírus é extremamente inteligente que consegue escapar de facto ao sistema. Portanto o plano B é o da prevenção. A maior probabilidade de morte atualmente ainda é o risco de andar na estrada. É a maior probabilidade de morrer. E nós continuamos a sair à estrada, andamos nos passeios, atravessamos a passadeira. É certo que todos nós conhecemos casos de mortes devido a atropelamentos em passadeiras. A vida é um risco. Nós não podemos viver sem riscos. E se começarmos a meter esta ideia na cabeça iremos entrar em “parafuso”, iremos ficar complicados e não iremos discernir as coisas como deve ser. Portanto nós esperamos que a vacina venha, mas enquanto não vier, de facto, a situação irá evoluir. Todas as pandemias da história tiveram um princípio e um fim. A infeção abrange um determinado número de pessoas e depois a comunidade limita a infeção, portanto teremos de fazer a prevenção, temos de viver com isto.
Sobre a 2ª vaga
A segunda vaga é um raciocínio por similaridade com outras epidemias, é possível e tem a ver com o facto de não termos os cuidados de prevenção. E de facto o “problema” da prevenção é que esta mexe com os nossos hábitos do dia-a-dia e é muito difícil. Vejo por mim próprio, quero coçar o olho, ou o cabelo, ou o nariz e é terrível, temos de estar constantemente a lembra-nos disto, e por isso é que defendo que as pessoas deveriam usar máscara sistematicamente.
Sobre Testes sorológicos
Acho que há alguma confusão sobre o assunto. Os testes sorológicos, são testes para determinar se tivemos ou não contacto com o vírus. Há duas avaliações, uma chamada a imunoglobulina M e outra a imunoglobulina G. Portanto a M significa que a pessoa esteve em contacto com esse micróbio e ele ainda lá anda. A G mostra que a pessoa esteve em contacto, mas que o micróbio já não está lá. O importante é saber a memória biológica, e essa não é a mesma para os diversos micróbios. Portanto os testes sorológicos são importantes para sabermos de facto qual foi a percentagem de contacto e compararmos com os números que temos dos sintomáticos. Assim teremos uma maior perceção da doença.
Máscaras: sim ou não?
Normalmente, nós dividíamos as máscaras, fundamentalmente em, máscaras que não deixavam sair, perdoe-me a expressão os perdigotos: depois, as máscaras P1, P2 e P3, que eram máscaras que eram muito importantes quando estamos perante uma pessoa que está a expelir gotículas para o ar e que, de facto, é importante que não as cuspinhamos. Por exemplo, no caso da tuberculose, que é um dos maiores dos exemplos de doenças transmitidas por aerossol, o P2 é muito importante e nalguns casos, em algumas doenças ainda mais infeciosas, poderá usar o P3 que é muito difícil de aguentar, durante bastante tempo. Portanto, isto tem a ver, de facto, com o tamanho das gotículas. Quando falamos, de facto, a maior parte das gotículas que nos saem, ficam ali pelos 1.5metros, 2 metros. Tem de haver esse distanciamento social. Agora: quando? Quando esses micróbios são muito, muito pequenininhos, podem transmitir-se por aerossol, esses podem migrar muitos metros. No Covid, quando se faz aerossóis, porque a pessoa está com falta de ar ou tosse, aí gera-se muito mais e também, podem passar e por isso é que, nos hospitais, tem usado máscaras P2. Agora a máscara cirúrgica, é uma máscara, sem dúvida, importante, e útil, segura. As máscaras sociais, na comunidade, se tiverem o padrão de certificação, por mim tudo bem.
Informação e desinformação
Todos nós devemos envolver-nos na divulgação da informação e portanto, quem está perto de nós, como as juntas de freguesia, as igrejas, tudo o que é perto da rua, e onde as pessoas digam que é palpável, digamos, que não é uma coisa virtual, é muito importante para transmitir informação. Portanto, isto é fundamental, sem dúvida alguma. Agora é preciso, também, respeitar, e nós sabemos que as pessoas respeitaram as indicações deste confinamento, no seu geral, mas nós também sabemos como é que somos! Somos todos um bocadinho rebeldes, nesta coisa de ficar assim, muito tempo parado, confinado, não sair, não ir à praia. É preciso, de facto, uma consciência social muito importante.
Sobre o desconfinamento
Isto questiona o nosso dia-a-dia, claramente, e nós temos de estar sempre, por exemplo, a limpar, como está dito, os puxadores das portas, temos que andar com esse desinfetante, gel de base alcoólica, ao entrarmos no autocarro, ou ao entrarmos no restaurante, de facto, desinfetarmos as mãos. Então porque é que não usamos luvas, sempre? Eu acho as luvas muito perigosas, muito perigosas, particularmente para todos os outros, porque, de facto, a pessoa com luvas, não tem cuidado com nada. Acho que nós vamos ter de retomar a nossa vida, com cuidados. Inclusive os restaurantes, sim, os restaurantes vão ter de, mantendo aquelas distâncias, vão ter metade, ou ligeiramente menos de metade dos clientes que tinham habitualmente. Os transportes públicos, excelente esta história de porem, obviamente, as máscaras, sem dúvida, e o facto de terem distanciamento. Nos hospitais, por exemplo, a maior parte das consultas, pelo menos das pessoas que eu conheço na minha área, não ficaram por fazer, fizeram-se por teleconsulta, passamos as receitas, pedimos análises e remarcamos as consultas, não se perderam. Para a semana, metade dos doentes vem, mas vem à sua hora, o médico tem de respeitar as horas, os minutos atribuídos por doentes não são fixos e vão sentando, ali, com dois espaços de cadeira separados e, também, só entram nessa fase depois, quando, o porteiro e o segurança, de facto, comandando essas entradas. Portanto, são cuidados que se podem ter, que se devem ter e com isto, nós podemos ir retomando a nossa vida.
Sobre o futuro
Eu acredito na imunidade da comunidade, sem dúvida, acredito. Mas eu creio que a atitude que a DGS tomou e que o Governo português pôs em prática, de facto, permitiu que a nossa curva fosse mais plana, não entupisse os hospitais, e isso foi muito, muito importante, porque não tínhamos tantas camas, mas, por outro lado, a imunidade da comunidade vai-se desenvolver, portanto, as estratégias não são antagónicas, nós tivemos uma estratégia para chegarmos à imunidade da comunidade, uma estratégia de contenção, mas a imunidade da comunidade vai-se estabelecer, sem dúvida.
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Edição e texto: Catarina Soutinho | Transcrição: Sofia Vieira e Inês Miranda | Design Gráfico: Melissa Costa