“Quando penso no meu percurso três palavras que me vêm à cabeça – ponderar, decidir e arriscar!” afirma Teresa Ponce de Leão, presidente do Laboratório de Energia e Geologia (LNEG), desde 2009, professora na FEUP, membro da Ordem dos Engenheiros e uma das engenheiras mais respeitadas do país.
“No meu percurso não tive, nem tenho, que me queixar pelo facto de ser mulher” deixa claro durante esta entrevista. Teresa Ponce de Leão não tem dúvidas quanto a qualidade dos futuros e no facto da Engenharia ser “uma permanente descoberta.”
Nome: Teresa Ponce de Leão
Formação: Doutoramento em Engenharia Electrotécnica e Computadores área de Energia, Master on Regulation pela Florence School of Regulation, pós-graduação AESE PADE e AESE AMEG, e engenheira Electrotécnica e de Computadores.
Função atual: Presidente do LNEG
Empresas anteriores: FEUP, ADENE, EFACEC
Não se trata apenas da presidente do LNEG. O seu currículo é extenso. Quem é a Teresa Ponce de Leão?
Sou Engenheira Electrotécnica, área de energia. Trabalhei ano e meio na EFACEC e desde aí sou Professora na FEUP no departamento de Electrotecnia, área de Energia. Em 2004 fui convidada a assumir a vice-presidência no INETI (Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação) com coordenação da área científica e desde então o meu percurso tem estado ligado à gestão científica que acumulo com orientações na FEUP. Atualmente, e desde 2009, sou Presidente do Laboratório de Energia e Geologia, entidade que sucedeu ao INETI nas áreas que lhe dão o nome, Energia e Geologia. O LNEG é o Geological Survey de Portugal.
Tenho assumido funções internacionais, desde a avaliações variadas para a Comissão Europeia, mas também executivas, sou 1ª vice-presidente da European Sustainable Energy Innovation Alliance, sou vice-presidente executiva da European Energy Research Alliance (pilar da investigação em energia do Strategic Energy Technologies Plan da Comissão Europeia) sou ainda chair do sub-grupo das Nacões Unidas, United Nations Resource Management Systems e ainda membro do Governing Board do European Geological Surveys.
Hoje em dia já é mais habitual, mas provavelmente quando começou a sua carreira as oportunidades para mulheres engenheiras não seriam muitas. Que retrospetiva faz do o seu percurso? Que dificuldades e que ensinamentos?
No meu percurso não tive nem tenho que me queixar pelo facto de ser mulher. Não lutei em atletismo ou natação com homens, lutei com homens e mulheres por cada cadeira do curso, lutei, luto, por melhor ensinar homens e mulheres a quem leciono, lutei e luto na gestão de homens e mulheres no LNEG, anteriormente INETI e lutei e luto sempre, quando represento o nosso país em qualquer fórum internacional, onde o género não é fator diferenciador. Quando penso no meu percurso três palavras que me vêm à cabeça – ponderar, decidir e arriscar! Após uma imprescindível ponderação tomar a decisão, mesmo que só, e correr o risco pessoal da sua implementação, ancorando-me sempre no grupo, a que pertenci ou representei, fosse ele a FEUP, o LNEG ou meu país.
Quais os skills mais importantes que os jovens Engenheiros devem ter para conseguir ter uma carreira de sucesso?
Penso que deva ser uma curiosidade e uma vontade quase fanática de aprender. O curso é apenas uma ferramenta que nos ajuda a pensar e abrir portas e querer saber mais. É um início de um caminho em que todos os dias temos que aprender e é essa apetência para sorver conhecimento que aconselho a todos os jovens. As mentes devem estar abertas para o mundo. Todos somos mais felizes quando aprendemos coisas novas. E … têm que saber que sozinhos não nunca atingirão as metas mais difíceis que pretendam transpor.
Quais os erros que não podem cometer?
Ser arrogante e pensar que somos melhor que os outros. Isto nunca é verdade, o conhecimento depende muito de sabermos partilhar e receber o conhecimento de outros. Não nos podemos fechar na nossa zona de conforto porque pensamos que dominamos. A partilha e a colaboração são a chave para o sucesso.
É presidente de uma instituição de referência, o Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), quais acha serem os desafios da Engenharia no futuro?
A engenharia não produz resultados per si. Os projetos estão inseridos na sociedade, dependem das condições de contorno que muitas vezes são extremamente incertas e voláteis. Vejamos o que se passa com as matérias primas críticas no momento de transição energética que vivemos. Um engenheiro quando desenha um projeto tem que analisar toda a informação inerente ao projeto, técnica ou não, tem que planear as etapas do projeto que dependem dessa informação de base e dos clientes finais. Tem que ser capaz de trabalhar com equipas multidisciplinares e integrar a informação e gerir essa mesma informação.
Na sua opinião, acha que temos Engenheiros preparados para o futuro cada vez mais imprevisível?
Os jovens são tão competentes como nós éramos na mesma idade, talvez mais pois o mundo está aberto para eles. Têm capacidades adaptadas à realidade atual e claramente são diferentes e como vivem momentos de grande incerteza, como são os nossos dias, têm vindo a construir essa capacidade de adaptação porque o ser humano adapta-se e é resiliente. Temos bons engenheiros ávidos de fazer algo pela nossa sociedade, alertados para os problemas e alinhados com as estratégias de resolução.
Como vê a Engenharia que se faz em Portugal, na sua área em concreto. Consegue identificar o melhor e o pior?
Temos magnificas escolas de Engenharia e engenheiros, mas, por exemplo, no sector público cada vez são chamados em menor número a posições de análise e decisão. Um erro a meu ver.
Sendo Engenheira, inscrita na Ordem, qual acha que deveria ser o papel da Ordem na vida dos Engenheiros e na sociedade civil?
Devia ser um, ainda maior, garante de salvaguarda da qualidade da Engenharia e divulgação dessa mesma qualidade, não o simples passaporte para técnico de alvará, ou coisa semelhante.
A Engenharia ainda é uma profissão de homens, ou isso já uma perceção errada?
Completamente errada. Uma pergunta que no campo da engenharia já não se deve pôr.
Nomeie um/a engenheiro/a que esteja a desenvolver um trabalho que aprecia, dentro ou fora de Portugal.
O meu colega Fernando Lobo Pereira que infelizmente morreu este mês de forma trágica. É o exemplo do engenheiro reconhecido internacionalmente pelos melhores da sua área, dedicado aos pares e sem necessidade de protagonismo, quiçá bastante modesto. Infelizmente para a engenharia portuguesa ficamos sem esse grande engenheiro, esse grande professor da FEUP e esse grande amigo.
Há Engenharia em tudo o que há?
Tudo no nosso dia a dia tem engenharia por trás. Os edifícios onde vivemos e trabalhamos, as vias de transporte sejam elas quais forem, os materiais para os instrumentos do dia a dia, desde o copo onde bebemos água ao computador onde teclo as respostas às suas perguntas, mas não acabaria neste texto se tivesse a ousadia de descrever tudo onde há Engenharia. Há Engenharia desde que o Homo Sapiens começou a descobrir, a fazer, e a engenharia é a permanente descoberta.
Entrevista: Catarina Soutinho | Design: Melissa Costa